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Como Mary Shelley Introduziu o Feminismo no Romantismo Literário

Descubra como Mary Shelley inseriu ideias feministas na literatura romântica, explorando o papel das mulheres em suas obras, como Frankenstein, e desafiando as normas sociais da época de maneira inovadora e sutil.

O nome Mary Shelley é quase sempre associado a seu clássico da literatura, Frankenstein. Embora essa obra tenha garantido seu lugar entre os gigantes da literatura, há um aspecto de seu trabalho que frequentemente é subestimado: seu impacto na literatura romântica e como ela trouxe questões feministas para esse movimento predominantemente masculino. Mesmo que não seja imediatamente óbvio, Mary Shelley fez algo notável ao inserir ideias feministas no coração do romantismo literário.

Pintura de óleo em tela retratando busto de Mary Shelley, século 19.
Fonte: commons.wikimedia.org

Neste artigo, vamos explorar como Mary Shelley contribuiu para o desenvolvimento da literatura romântica de uma maneira que abriu espaço para as mulheres feministas, oferecendo novos olhares sobre o papel feminino tanto na sociedade quanto na arte.

O Contexto do Romantismo Literário

Antes de mergulharmos no papel de Shelley, é importante entender o contexto em que ela estava inserida. O romantismo literário foi um movimento que surgiu no final do século XVIII, em resposta ao racionalismo do Iluminismo. Os românticos celebravam a natureza, as emoções e o indivíduo. Escritores como William Wordsworth e Samuel Taylor Coleridge eram ícones do movimento e enfatizavam a busca pela liberdade e pela expressão pessoal.

Contudo, a maioria dos protagonistas nas obras românticas eram homens, e as mulheres feministas ainda lutavam para ter suas vozes ouvidas em um cenário literário dominado pelo sexo masculino. Foi nesse espaço que Mary Shelley apareceu, oferecendo uma nova perspectiva.

A Influência de Mary Shelley no Romantismo

Uma Jovem Educada para Questionar o Status Quo

Mary Shelley não surgiu de um vazio. Ela era filha de Mary Wollstonecraft, uma das pioneiras do feminismo, autora do clássico A Vindication of the Rights of Woman – Uma Reivindicação dos Direitos da Mulher, em tradução livre –. Sua mãe defendeu a ideia radical (para a época) de que as mulheres deveriam receber a mesma educação que os homens, uma noção revolucionária que influenciaria profundamente Mary Shelley.

Apesar de sua mãe ter morrido logo após seu nascimento, Shelley cresceu cercada pelas ideias progressistas de Wollstonecraft. Seu pai, William Godwin, era um famoso filósofo que também acreditava na igualdade dos sexos e incentivava o pensamento crítico. Shelley foi criada em um ambiente que a encorajava a questionar o papel tradicional das mulheres, algo que acabaria refletido em sua obra.

Frankenstein e o Feminismo Implícito

Você provavelmente já ouviu falar de Frankenstein. Publicado em 1818, quando Mary Shelley tinha apenas 20 anos, o livro é amplamente reconhecido como uma obra-prima do horror e da ficção científica. Mas o que muitas vezes passa despercebido é como Frankenstein também toca em questões feministas de maneira sutil.

“Eu sou maligno porque sou miserável. Acaso não sou rejeitado e odiado por toda a humanidade?”

– A criatura de Frankenstein

As Personagens Femininas e Suas Vozes Silenciadas

Em Frankenstein, as personagens femininas desempenham papéis aparentemente menores. Elizabeth, a noiva de Victor Frankenstein, Justine, uma criada, e a própria criatura são figuras que representam a marginalização das mulheres na sociedade. No entanto, essas personagens são mais do que coadjuvantes. Elas são exemplos claros da impotência e da vulnerabilidade das mulheres em uma sociedade dominada por homens.

Por exemplo, Elizabeth, que deveria ser a companheira de Victor, tem uma vida moldada pelas decisões dele e de outros homens ao seu redor. Ela é uma figura dócil e obediente, cujo destino trágico reflete o destino de muitas mulheres na época. Isso é um comentário sutil sobre como as mulheres, mesmo as mais próximas de homens poderosos, eram subjugadas e privadas de uma voz ativa.

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A Criação Sem a Participação Feminina

Outro aspecto feminista de Frankenstein é a própria criação da criatura. Victor Frankenstein desafia as leis da natureza ao criar vida sem a ajuda de uma mulher. Ele assume o papel de “criador” em um ato que exclui completamente a mulher da narrativa de criação, algo que poderia ser interpretado como um comentário sobre o controle masculino sobre os processos de vida.

Entretanto, sua criação acaba se tornando um desastre. Isso pode ser lido como uma crítica à ideia de que os homens podem controlar e manipular a vida sem consequências. O fracasso de Victor Frankenstein é uma metáfora para o fracasso de uma sociedade que tenta marginalizar as mulheres e excluí-las de processos essenciais da vida.

O Romantismo Gótico e o Feminismo de Shelley

O feminismo de Mary Shelley não se limitava a Frankenstein. Ela também trouxe questões feministas para o subgênero do romantismo gótico, que ela ajudou a moldar. No romantismo gótico, os temas de medo, isolamento e a busca por poder muitas vezes se misturam com uma exploração das dinâmicas de gênero.

Mulher sentada em primeiro plano com três homens sentados ao fundo.

Em muitas de suas obras, Shelley explora o papel submisso da mulher e os horrores de uma sociedade patriarcal. Suas personagens femininas geralmente são oprimidas, mas ao mesmo tempo trazem uma força interna que desafia o status quo. Isso é particularmente evidente em The Last Man, um romance apocalíptico onde as mulheres desempenham papéis centrais na luta pela sobrevivência.

A Influência de Mary Wollstonecraft: Feminismo de Segunda Geração

Como mencionado anteriormente, a mãe de Mary Shelley, Mary Wollstonecraft, foi uma das primeiras mulheres feministas a escrever sobre os direitos das mulheres no contexto da sociedade européia. Embora Wollstonecraft tivesse uma abordagem direta em sua defesa pelos direitos das mulheres, Shelley optou por um caminho mais sutil. Ela inseriu as ideias feministas em suas obras de forma que os leitores tivessem que ler nas entrelinhas para entender suas críticas à sociedade patriarcal.

A Educação Feminina em Debate

Assim como sua mãe, Shelley acreditava que a educação era a chave para a igualdade das mulheres. Em várias de suas cartas e ensaios, ela defendeu a necessidade de uma educação igual para ambos os sexos, e essa crença transparece em sua literatura. Embora Shelley não tenha escrito manifestos feministas explícitos como Wollstonecraft, ela usou suas personagens femininas para ilustrar os perigos de uma sociedade que nega às mulheres as mesmas oportunidades educacionais que os homens.

Mulheres Históricas: A Evolução do Feminismo

The Last Man: Feminismo no Apocalipse

Enquanto Frankenstein é a obra mais famosa de Shelley, The Last Man também merece destaque quando falamos sobre seu impacto na literatura romântica e nas mulheres feministas. Publicado em 1826, esse romance é uma das primeiras obras de ficção apocalíptica e trata de um mundo devastado por uma praga.

No centro da narrativa estão personagens femininas fortes que, em meio à destruição do mundo, lutam para sobreviver e se afirmar em uma sociedade em colapso. Essas mulheres, ao contrário de muitas personagens femininas típicas da época, têm autonomia e voz. Elas questionam as normas sociais e, em muitos casos, assumem papéis de liderança em um cenário onde os homens falham.

Esse é um exemplo poderoso de como Shelley usou a ficção para desafiar os papéis tradicionais de gênero e abrir espaço para uma discussão sobre a importância da voz feminina em tempos de crise.

A Pioneira Feminista no Romantismo Literário

Mary Shelley foi mais do que a criadora de Frankenstein. Ela foi uma visionária que inseriu ideias feministas em uma era em que as vozes das mulheres feministas eram muitas vezes silenciadas ou ignoradas. Embora seu feminismo possa não ter sido tão explícito quanto o de sua mãe, ele estava presente em suas obras, pronto para ser descoberto por leitores atentos.

O Legado Feminista de Mary Shelley

Hoje, Shelley é reconhecida não apenas como uma autora pioneira da literatura romântica, mas também como uma das primeiras a trazer questões feministas para o centro da narrativa literária na Europa. Suas personagens femininas, mesmo quando marginalizadas, refletem as lutas das mulheres em uma sociedade que as relegava a papéis secundários.

Shelley abriu caminho para futuras gerações de mulheres feministas na literatura, mostrando que a escrita podia ser uma ferramenta poderosa para desafiar o patriarcado e questionar as normas estabelecidas. Seu trabalho continua sendo uma fonte de inspiração para escritoras e leitores que buscam explorar temas de gênero, poder e resistência na literatura.

O Impacto no Feminismo e no Romantismo Literário

Mary Shelley introduziu o feminismo no romantismo literário de maneira inovadora, usando suas histórias para criticar sutilmente o papel subordinado das mulheres na sociedade de sua época. Ao fazer isso, ela pavimentou o caminho para que as mulheres feministas encontrassem sua voz, tanto na literatura quanto além dela.

Embora seu feminismo não fosse tão direto quanto o de sua mãe, suas histórias e personagens levantam questões importantes sobre igualdade, poder e o papel das mulheres em um mundo que muitas vezes as marginaliza. Shelley, portanto, não foi apenas uma das primeiras grandes autoras da literatura romântica, mas também uma defensora das mulheres, cujas ideias continuam a ressoar até os dias de hoje.

Espero que este artigo tenha lhe ajudado a entender mais sobre literatura e feminismo. Veja abaixo uma relação das principais obras publicadas por Shelley em ordem cronológica, e siga ampliando seus horizontes literários:

Título da ObraAno de Publicação
Frankenstein, ou o Prometeu Moderno1818
Valperga1823
O Último Homem (The Last Man)1826
O Perjúrio ou o Destino (Perkin Warbeck)1830
Lodore1835
Falkner1837
Histórias de Viagem (Rambles in Germany and Italy)1844
MathildaPublicado postumamente em 1959
Lista de publicações de Mary Shelley em ordem cronológica
Referências
  1. O mito de Frankenstein: Imaginário & Educação – ARAÚJU, ALMEIDA e BECCARI (catálogo USP) Disponível em: https://www.livrosabertos.abcd.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/download/213/193/895?inline=1
  2. A atualidade de Mary Wollstonecraft, pioneira do feminismo – TV Boitempo
    Disponível em: https://youtu.be/9gYdMRzfjYI?feature=shared
  3. “Mulheres e Romantismo: A Visão Feminina na Literatura do Século XIX” – Livro: Editora da Unesp